A construção do Colégio Japão-Brasil é prioritária como projeto comemorativo do centenário

 

Pesquisador do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros

Susumu Miyao nasceu na Fazenda Aliança (situada no atual município de Mirandópolis), estado de São Paulo. Em 1939, aos 9 anos de idade, viajou para o Japão para tornar-se sucessor da família paterna naquele país. Foi matriculado na terceira série para formar-se na escola primária. No curso secundário, a partir de 1944, com a guerra do Pacífico, a mobilização compulsória de estudantes fez com que passasse a trabalhar em fábricas. Concluiu o curso de filosofia, da Faculdade de Letras da Universidade de Shinshû, em 1953. O Japão passava, então, por extrema privação de pós-guerra. Nesse ano, resolveu regressar ao Brasil. De 1954 a 56, se tornou professor de língua japonesa na Escola Vergueiro, um estabelecimento nikkei para moças. Assumiu, em seguida, o cargo de redator-responsável da “Lavoura e Cooperativismo”, revista editada pela Cooperativa Agrícola de Cotia. Ficou nesse cargo até 1966. Participou, em 1965, da fundação do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, como diretor. De 1991 a 2003, foi diretor-executivo desse estabelecimento de pesquisa, dedicando-se, especialmente, aos estudos de história dos imigrantes japoneses do Brasil. Presentemente é conselheiro do referido Centro. Os trabalhos reunidos neste livro são os resultados das reflexões feitas ao longo dos anos sobre os dados recolhidos.

 

 

Prefácio

Durante a última eleição para a presidência da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, eu, na posição de pesquisador do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, entidade que estuda a comunidade nipo-brasileira, vim observando, sem apoiar nenhuma das chapas – isto é, a do Sr. Uehara e a do Sr. Tani –, as propostas de ambas. Como já é do conhecimento público, o vencedor foi do Sr. Uehara. No entanto, a proposta desta para o projeto comemorativo do centenário da imigração japonesa no Brasil, a construção de um grandioso Centro de Integração Nipo-Brasileiro no bairro de Leopoldina na capital paulista, foi retirada devido à contestação da oposição, o grupo do Sr. Tani e seus simpatizantes. Embora, a proposta da oposição apresentava certa semelhança, apresentou, como principal projeto do centenário, a ampliação de atual prédio da Sociedade, baseado no forte apego ao bairro da Liberdade, berço do atual bairro oriental, como manifestação de nostalgia. Embora a chapa do Sr. Tani tenha sido derrotada na eleição, seu projeto conquistou pelo quesito localização, o apoio maciço pela maioria, o que resultou na retirada da proposta do Centro de Integração pela chapa do Sr. Uehara.

De qualquer forma, ambas as propostas trataram apenas de construção de prédios. E, não pude observar objetivamente, a presença em  seus manifestos e propostas eleitorais, da importante e básica visão sobre como deverá ser e como conduzir a futura comunidade nikkei, quando faltam apenas três anos para o centenário.

É admissível que queiram construir prédios, porém, ainda falta devida  explicação pelos candidatos sobre como seriam utilizados e quem seriam os beneficiários desta construção.

Não são poucos os casos em que conhecemos de prédios construídos, mas, que têm poucos usuários, não gerando recursos mesmo para sua de manutenção básica. Não é erguendo um grandioso edifício que se reuniriam, assim, automaticamente, as pessoas. É fundamental, antes de construir, que exista um público interessado naquilo que essa construção abrigará e que esse público tenha prazer em usufruí-la. Ou seja, para que um projeto de construção seja bem-sucedido, antes de qualquer coisa, é preciso que um grande número de pessoas se interessasse pelo seu teor. Neste sentido, nenhuma das chapas foi clara.

O que é preciso saber antes de se construir um prédio

A comunidade nipo-brasileira que a geração dos imigrantes vinha se empenhando em construir, chegara ao seu auge na época das comemorações dos 70 anos e, desde então, vem se deteriorando a olhos vistos. Uma das principais causas desta decadência é o envelhecimento dos imigrantes, implicando na limitação de sua capacidade de atuação.  Contudo, considerava se mais grave do que isso é a falta de intenção, nas gerações de nissei em diante, de suceder e desenvolver este legado recebido das gerações anteriores em busca de uma maior prosperidade da coletividade no futuro. Entretanto, uma reflexão melhor, hoje, leva à conclusão de que a responsabilidade pelo declínio da comunidade não pode ser atribuída  a estas novas gerações.

Os imigrantes vindos ao Brasil antes da Guerra, depois de confrontar amargamente a derrota de sua pátria, finalmente tomaram a decisão de se radicar em terras brasileiras no início da década de 1950. Ao mesmo tempo, esta geração foi abandonando o ensino da língua japonesa, bem como o da tradição japonesa a seus filhos.  Assim, abandonando o sonho de voltar ao Japão, após formar patrimônio pessoal, para o qual se haviam envidado grandes esforços, transformou este esforço em propiciar a seus filhos uma formação acadêmica como caminho de conseguir a ascensão social. Esse empenho foi recompensado na forma de um nível de instrução extremamente alto dos nisseis dentro da sociedade – com isso, os filhos de japoneses conquistaram fama de doutores e assim passaram a gozar de alta renda, inserindo-se nos mais variados segmentos da sociedade. Consequentemente, os nisseis acabaram se afastando da comunidade nipo-brasileira e a ela não retornaram, contrariando as expectativas de seus pais. E a comunidade, com o envelhecimento da geração dos imigrantes, veio perdendo sua força.

Foi neste contexto que, acredito eu, a chapa do Sr. Uehara, formada em sua maioria por nisseis, e a do Sr. Tani, representante da geração dos imigrantes pós-guerras, travaram duelo, cientes desta situação e sentindo a necessidade de reformular a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e Assistência Social – Bunkyo – que um dia teve sua presença e função como uma entidade que representava toda a comunidade nipo-brasileira, mas, hoje reduzida a uma simples entidade regional.

No entanto, tenho minhas dúvidas quando questionado se os dois candidatos tinham conhecimento deste processo histórico da nossa comunidade, e dos desafios de como revitalizá-la, já que nenhum dos dois apresentou planos concretos, nem durante nem depois do pleito. Tenho a forte impressão de que o duelo era somente para decidir quem iria ficar com o projeto de construção do Centro de Integração.

Nesse desafio de reconstruir a nossa coletividade, temos que nos ocupar com que é prioritário, e para isso é imprescindível compreender em maior profundidade a situação em que a nossa comunidade se encontra.

 

Situação atual da comunidade nipo-brasileira

Fazendo uma estimativa do quadro demográfico dos nipo-brasileiros, com base no censo realizado, há 17 anos, pelo Centro de Estudos Nipo-Brasileiros como uma das atividades comemorativas dos 80 anos de imigração japonesa no Brasil, podemos presumir que existe aproximadamente 1,5 milhões de nikkeis (dentre os quais aproximadamente 300 mil se encontram no Japão como dekasseguis).

Entretanto, nem todos os 1,5 milhões de nipo-brasileiros são necessariamente integrantes da comunidade ou da coletividade nipo-brasileira. É primordial ter em mente que não existe nenhuma comunidade capaz de agrupar 1,5 milhões de pessoas.

Então, quantos serão os nikkeis que participam, sentindo pelo menos alguma identificação com esta “colônia japonesa” construída pela geração dos imigrantes?

A população da geração dos imigrantes é 70 e poucos mil integrantes (o censo nacional realizado em 2000 contou 52.496 residentes com nacionalidade japonesa, número considerado coerente subtraindo-se as pessoas que foram ao Japão como dekasseguis). Já a população da segunda geração, cuja maioria com idade mais avançada, apresenta tendência de encolhimento, apesar de uma parcela desta geração ainda mantém algum envolvimento com a comunidade. Em relação às gerações mais novas, podemos afirmar que é extremamente raro encontrar alguém que se sinta alguma identificação com a “colônia” (o fato é comprovado pela pouquíssima participação de pessoas da terceira geração na referida eleição). Pela minha estimativa, a terceira geração é o grupo mais representativo em termos quantitativos, correspondendo a quase metade dos 1,5 milhões de nipo-brasileiros, porém, a pesquisa de 17 anos atrás já mostrava que 42% desses sanseis eram mestiços. Desta forma, hoje esta porcentagem deve ser maior, correspondendo a cerca de 60% da terceira geração. Na quarta geração, que apresenta maior crescimento hoje do que na pesquisa de 17 anos atrás, 62% eram mestiços, no contexto atual de tendência cada vez crescente de miscigenação, podemos estimar que cerca de 80% desta deve ser mestiços.

É inevitável que essa parcela de nipo-brasileiros, que tem apenas 1/2, 1/4 ou 1/8 de sangue japonês, perca rapidamente sua identidade japonesa. Ou seja, as gerações posteriores a terceira devem ser consideradas iguais aos brasileiros não descendentes.

Nós, até hoje, denominamos esse grupo de pessoas de “nikkei”, mas, acredito que, em breve, chegará o dia em que até esta palavra desapareça.

Esta é a verdadeira e atual trajetória de nossa comunidade nipo-brasileira. Sendo assim, estimo que a parcela de pessoas, que se sentem incorporadas e mantêm algum vínculo com a coletividade, deva representar pouco menos de 10% da população total dos nipo-brasileiros, ou menos de 100 mil pessoas.

De fato, será um enorme desafio construir uma nova comunidade nipo-brasileira que substitua essa debilitada “colônia japonesa”.

É evidente que, na situação em que as gerações além da terceira vão mostrando uma tendência de miscigenação cada vez maior, seria irreal, ou melhor, sem sentido, pensar em estruturação de uma comunidade voltada exclusivamente aos nipo-brasileiros.

 

 

É fundamental formar pessoas interessadas na cultura japonesa

Entretanto, desistir e abandonar o desafio de reconstrução da nossa comunidade,  por  causa desta situação difícil e adversa, implicaria fazer a sociedade esquecer o fato histórico de que houve a imigração de 260 mil japoneses ao Brasil, e suas contribuições, bem como, as da segunda geração nas mais variadas áreas da sociedade brasileira,  apagando assim da história deste país a razão da existência dos imigrantes japoneses e seus descendentes.

Tenho conhecimento de que existe, entre os nisseis e sanseis, a opinião de que “nós nikkeis estamos muito bem assimilados à sociedade brasileira, isto não é suficiente?”

Assimilação significa que imigrantes de um grupo étnico se desligam da sua raiz e esquecem sua cultura e sua origem, diluindo-se, assim, totalmente na sociedade brasileira. No período pré-2.ª Guerra Mundial, na década de 30, o governo Vargas levou a efeito uma política de assimilação, de maneira até forçada, junto aos imigrantes, entre outras, de origem japonesa e alemã, que relutavam em se integrar à sociedade brasileira. Em função desta política, foi proibido o ensino para crianças menores de 14 anos de idiomas que não o português e a publicação de jornais em suas línguas maternas.

Porém, ultimamente, o Brasil mudou seu foco em relação à assimilação,  reconhecendo a sociedade com diversas etnias e culturas (melting pot), onde cada etnia contribui com seus atributos, fazendo parte do mosaico que é sociedade brasileira.

Contudo, neste contexto do período pós-guerra, as segunda e terceira gerações de descendentes japoneses vêm se inserindo nos mais variados setores sociais, assim, trilhando rapidamente o caminho da assimilação, aquela que aspirava o governo Vargas.

Na atual conjuntura, em que a sociedade brasileira tem como seu ideal, tendo como analogia, uma salada mista (uma travessa de salada, que é a sociedade brasileira, onde alface e tomate comparecem cada um com seu sabor original sem perder sua identidade)  com vistas à formação de uma sociedade integrada, composta pela vasta bagagem cultural trazida pelos imigrantes de várias etnias e transmitida para as próximas gerações. Então, por que os nipo-brasileiros têm seguido um caminho de assimilação tão drástica como jamais se observou entre outras etnias, a ponto de se tornar motivo de surpresa para alguns pesquisadores brasileiros? Eis uma questão que merece a nossa atenção para que possamos entender melhor a nossa maneira de ser, isto é, do povo japonês e de seus imigrantes que vivem no Brasil.

 

A prioridade é a fundação de instituição de ensino

Pelas considerações já descritas anteriormente, qual deve ser a prioridade a ser trabalhada em prol da construção de uma nova comunidade nipo-brasileira? Antes de tudo, é fácil compreender que não tem nenhum sentido pensar em construir tão grandioso prédio.

Antes de pensar em qualquer construção, devemos difundir, entre público brasileiro em geral, incluindo nele nossas segunda e terceira geração, a cultura japonesa trazida pelos imigrantes.

Para as gerações mais novas, esta ação pode significar transmissão de cultura japonesa, porém, de qualquer forma, é fundamental neste momento difundir e transmitir amplamente a nossa cultura aqui neste país.

A cultura japonesa a que me refiro aqui não se limita somente, como normalmente algumas pessoas tendem a interpretar, de maneira equivocada, às manifestações artísticas tangíveis e visíveis, como ikebana ou cerimônia do chá, mas também às características e virtudes espirituais da nossa cultura, no sentido mais amplo, cultivadas ao longo da história. É nosso dever  fundamental difundir essa cultura junto ao povo brasileiro, do qual as gerações mais jovens fazem parte.

A Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e Assistência Social,  Bunkyo, proclamara, como sua missão, quando da sua fundação, que ela visava não somente representar as entidades nipo-brasileiras, mas também, conforme a própria denominação, “apresentar, de forma proativa, a cultura japonesa ao povo brasileiro, bem como promover e intensificar o intercâmbio cultural entre os dois países”.

Logo, podemos dizer que a reestruturação da Bunkyo deve ter como objetivo principal ser centro da difusão da cultura japonesa junto ao povo brasileiro, voltando sua missão original. Mesmo porque atualmente existem pouquíssimas pessoas, inclusive nas novas gerações de nipo-brasileiros, interessadas na cultura japonesa.

Nos últimos anos, observamos aumento de interesses por certas manifestações culturais do Japão, como o boom da culinária japonesa, interesse pelo “Bushido” com o lançamento do filme “O Último Samurai” e a ótima vendagem do livro “Miyamoto Musashi, bem como a febre de animê entre os jovens brasileiros. As pessoas interessadas nesses aspectos culturais têm procurado o ensino do idioma, aumentando a demanda por escolas de língua japonesa pelo público não descendente, –  o que tem compensado de alguma forma a brusca queda do número de alunos nikkeis – o que  não deixa de ser  um fenômeno bastante plausível.

Para que tais fenômenos não sejam algo apenas passageiro, precisamos tomar providencias práticas e funcionais, ou seja, criar uma organização e estabelecimentos para difundir a cultura japonesa de forma mais sustentável. Para que isso aconteça, o primeiro trabalho que deve ser feito é a fundação de uma instituição educacional tendo como seu princípio básico a difusão da cultura japonesa.

 

Construção de um novo Colégio Japão-Brasil

Como seria, de forma específica, a instituição educacional como uma resposta para tudo que foi discutido até aqui?  Não se trata de nenhuma concepção inédita. Nada mais do que o “Colégio Japão-Brasil”, tema de repetidas discussões há décadas, mas que nenhuma vez chegou a se concretizar.

De fato, havia nas gestões anteriores à do Sr. Uehara, “Comissão de Estudo do Colégio Japão-Brasil”. Nesta comissão se discutiu durante alguns anos como essa escola deveria ser. Porém, na transição para a atual gestão, o projeto parece ter sido engavetado. Eu estive envolvido nesta comissão e apresentei um texto chamado “Opinião pessoal sobre a fundação do Colégio Japão-Brasil”, no qual irei me basear para apresentar a concepção básica do “Colégio Japão-Brasil”, conforme segue, acrescentando também o que eu penso hoje.

 

Para que fundar o Colégio Japão-Brasil?

O objetivo do Colégio Japão-Brasil, no meu ponto de vista, é a “difusão da cultura japonesa” neste país.

A nova geração de nikkeis logicamente deve fazer parte do público alvo, entretanto, quando essa escola for fundada, sua maioria será composta de mestiços para os quais nem sei se permanecerá a denominação “nikkei”. Sendo assim, não fará sentido incluir entre os princípios de fundação desse colégio, a transmissão da cultura japonesa às futuras gerações nikkeis, nem a formação de sucessores nikkeis de alto nível.

Considerando esta situação como a nossa premissa, o princípio de fundação do colégio não é senão a “difusão da cultura japonesa” junto ao povo brasileiro, sem excluir os descendentes japoneses também.

A difusão da cultura japonesa não pode se limitar a mera divulgação da cultura. O Colégio Japão-Brasil deve ter na sua visão institucional o cultivo de virtudes inerentes à cultura japonesa que possam contribuir para o desenvolvimento da sociedade brasileira. Estas qualidades serão ensinadas aos alunos e cultivadas entre eles, para que eles por sua vez as possam ir disseminando cada vez mais à sociedade em geral. Assim, quando finalmente a “integração” de todas as etnias culminar em uma nova civilização brasileira, a cultura japonesa terá contribuído para sua formação com seus valores e virtudes. Este é o objetivo que o Colégio Japão-Brasil deve ter.

No entanto, infelizmente a história comprova que falta, tanto entre os japoneses do Japão, desde políticos e empresários a cidadãos comuns, forte determinação e vontade de divulgar a “cultura japonesa” ao exterior, a outros países e outros povos. Nisto inclui os japoneses no Brasil. O Japão, desde sua formação como uma nação, enviou à China, então berço cultural do oriente, diversas delegações de estudiosos durante as dinastias T’ang e Sui, chamadas de “kenzuishi” e “kentôshi”, para absorver a sua civilização mais avançada e aproveitá-la como se fosse sua própria cultura, para então, a partir dela, construir uma cultura própria. É de amplo conhecimento que, após a Revolução Meiji, viajaram para a Europa Ocidental várias missões para absorver as culturas mais evoluídas com o objetivo de transformar seu país em um estado moderno. É do conhecimento de todos que o Japão obteve grande sucesso nessa empreitada.

Como se vê, a capacidade do povo japonês de receber e absorver as culturas alheias são ímpares, por outro lado, não seria exagero afirmar que o mesmo povo infelizmente carece, até hoje completamente, da capacidade de transmitir sua cultura às demais nações.

Nós, japoneses (inclusive nipo-brasileiros), não fazemos nenhuma ideia do porque da necessidade de divulgar a cultura japonesa aos povos de outras culturas.

E por quê? A resposta é a formação geográfica do próprio país. O Japão, sendo um país formado de algumas ilhas, que historicamente nunca sofreu invasão, podendo se manter em paz como um estado de uma só etnia, razão pela qual nunca se sentiu o motivo de se manifestar sua civilização país afora.

Quando nosso Centro de Estudos realizou a pesquisa sobre “Ensino de língua alemã na comunidade teuto-brasileira”, o diretor do colégio alemão fez o seguinte comentário:

“Nós nos empenhamos na difusão da cultura alemã, inclusive o ensino do idioma, por motivação emocional, pois queremos que nossas próximas gerações aprendam o idioma e herdam a nossa cultura. Ao mesmo tempo, a Alemanha tem feito grandes investimentos, com milhares de empresas alemãs fazendo negócios no Brasil. Neste contexto, cada brasileiro que aprenda o nosso idioma, conheça a nossa cultura e tenha maior compreensão sobre nosso país, ajudará não somente no sucesso destas empresas, mas também estará contribuindo aos interesses da Alemanha. O empresariado alemão demonstra compreensão deste princípio, e o vultoso apoio financeiro a nossa instituição é demonstração deste fato.”

Será que existe, mesmo que sejam infimamente, esta visão entre os líderes nipo-brasileiros, pessoas envolvidas no ensino da língua japonesa ou administradores das empresas japonesas que fazem negócios no Brasil?

A Câmara de Indústria e Comércio Japonesa no Brasil realizou, há alguns anos atrás, uma pesquisa sobre o pensamento e a postura das empresas japonesas em relação ao ensino da língua japonesa, que coincidiu com o resultado de outra pesquisa realizada por nós há mais de 20 anos atrás. As pesquisas mostraram, na sua grande maioria, a indiferença em relação à proficiência da língua japonesa e a preferência pela fluência no idioma inglês.

Posso citar outro exemplo. Como devemos interpretar o enorme investimento, como nós japoneses jamais sonharíamos que os países como a Inglaterra e a França, que não possuem comunidades de imigrantes no país, fazem no Brasil para difundir suas culturas, incluindo o ensino de idioma?

A Inglaterra possui, através do British Counsil, uma rede de mais de 10 escolas de língua, denominada Cultura Inglesa, na capital paulista, através das quais se empenha na disseminação de sua cultura. E, há alguns anos atrás inaugurou no bairro de Pinheiros o Centro Cultural para reforçar a difusão de sua cultura (o Centro Cultural incorpora o consulado inglês). A atuação da França é semelhante: possui uma rede de escolas de língua, chamada Aliança Francesa, e reserva uma verba generosa para difusão de sua própria língua e cultura.

Depois da Inglaterra e da França, a próxima potência em termos de investimento cultural feito pelo país de origem é a Alemanha. A Alemanha, além de se engajar, através do Goethe Institut (uma autarquia com investimento meio estatal e meio privado), na difusão da língua e cultura alemã, reúne entidades de origem alemã tais como colégios, câmara de comércio e indústria e consulados para formar um conselho consultivo onde se discutem e deliberam as formas mais eficientes e práticas para se difundir a língua e a cultura alemã no Brasil.

Por que será que esses países investem tanto na difusão de sua própria cultura? Analisando melhor, começa a transparecer uma correlação entre o número de colônias que esses países mantiveram pelo mundo afora na época do colonialismo e a dimensão do investimento na difusão de sua cultura no além-mar (as verbas da Inglaterra e da França são algumas dezenas de vezes maiores do que a da Fundação Japão; o orçamento da Alemanha também é dez vezes superior do que o dessa autarquia japonesa).

A experiência desses países na administração de suas colônias explica estes investimentos culturais. Eles sabem, pela sua própria experiência, que a difusão da sua cultura influencia diretamente seus interesses. Este know-how, mesmo depois do fim de sua hegemonia sobre as colônias, continua sendo válido. De fato, uma pessoa de ascendência alemã disse que “o investimento cultural no exterior não surte efeitos diretamente tangíveis; no entanto, em longo prazo, certamente beneficiará os interesses da nação”.

Embora, nós, japoneses e nipo-brasileiros, tenhamos nem tênue experiência histórica  para que possamos compreender a postura deles, não seria necessário aprender com eles a importância de se difundir a própria cultura fora do país?

O Japão teve a sorte, literalmente milagrosa, de ter tido uma história pacífica durante mais de mil anos desde o primórdio da sua nação. Contudo, como consequência desse período de paz, no mundo globalizado de hoje, o povo japonês ainda não domina os conhecimentos necessários para lidar com outras etnias ou outras culturas. Este fato não permitiu que se cultivasse dentro de seu território uma consciência étnica forte como outras etnias têm. Atributos negativos por conta da longa história pacífica persistem dentro do povo japonês, manifestando-se como falta de espírito internacional e consciência étnica.

Tais atributos ausentes não podem ser aprendidos de um dia para outro e ainda mais são difíceis de serem assimilados como se fosse algo nato. Dizem que os imigrantes japoneses no Brasil “se reconheceram ser japoneses”, somente depois que tiveram contato com etnias e culturas diferentes. Através do contato com outras etnias e culturas durante quase um século, os japoneses no Brasil aprenderam a lidar melhor com as pessoas de outras etnias do que os japoneses que permaneceram no Japão. Entretanto, é muito cedo para afirmar que os imigrantes japoneses desenvolveram uma consciência étnica e uma forma de pensar própria em função de sua percepção das outras etnias. Eu penso que a comunidade nipo-brasileira não se uniu como outras comunidades de imigrantes estrangeiros o fizeram para transmitir sua cultura às gerações seguintes, bem como para construir um colégio étnico com forte determinação de disseminar, também na sociedade brasileira, suas virtudes, devido à ausência dos atributos já comentados entre nós, imigrantes e nossa segunda geração.

A comunidade dos imigrantes coreanos, estimados em apenas 60 mil pessoas, conseguiu reunir um capital de três milhões de dólares em apenas 35 anos e, juntando outros três milhões de dólares em subsídios obtidos do governo do seu país de origem, fundou o Colégio Coreia-Brasil há alguns anos atrás. Esta façanha se concretizou graças ao forte espírito étnico encarnado nos coreanos, algo ausente entre os japoneses. A Coreia historicamente sofreu várias invasões dos países vizinhos, tais como a China e o próprio  Japão imperial, o que cultivou dentro de cada um dos coreanos uma forte consciência étnica, o que nós, japoneses, dificilmente conseguiremos compreender. E, para que as gerações futuras não percam esta consciência, a comunidade coreano-brasileira envidou enorme esforço para construir seu colégio étnico.

Em São Paulo, existem vários colégios de origem étnica, construídos pelas sociedades formadas pelos imigrantes europeus, sendo reconhecidos hoje como excelentes instituições. Está é o resultado de forte vontade e determinação, tanto pela comunidade dos imigrantes como pelo governo do país de origem, além de cada etnia transmitir sua cultura a gerações futuras, de participar na formação de uma nova cultura brasileira através da difusão de suas virtudes, e também, de uma maior compreensão por parte do povo brasileiro sobre o seu país de origem.

A ideia de “consciência étnica”, neste mundo globalizado, pode ser considerada como algo anacrônico. De fato, a manifestação exacerbada desta consciência tende a causar conflitos étnicos em vários cantos do planeta até hoje. No mundo atual, a consciência étnica fanática  não é bem vinda, mas a falta dela tampouco é desejável.

Se o processo de miscigenação entre os descendentes japoneses continuar neste ritmo acelerado, provavelmente na sexta geração 100% dos nipo-brasileiros serão mestiços e assim, a própria denominação “nikkei” irá desaparecer. Isto é a minha visão em relação ao futuro da comunidade nikkei. Estou certo de que este cenário se concretizará num futuro próximo. Admitir este cenário como um processo natural pode ser aceita como uma opinião, mas, acredito que não seja desejável, tanto para a maioria dos nipo-brasileiros, como para a sociedade brasileira, que preza hoje a diversidade étnica e cultural.

Mais cedo ou mais tarde, ao longo dos tempos, todas as etnias, que compõem a sociedade brasileira, irão se miscigenar e se fundir, formando uma nova civilização e cultura, mas, será fundamental, nesse processo gradativo, que cada etnia mantenha suas características culturais de modo a conferir uma personalidade marcante à cultura brasileira.

Neste sentido, acredito que o esforço de transmitir as virtudes da cultura japonesa, que contribuirá para a formação da sociedade brasileira, tanto à comunidade nipo-brasileira, como àquela, dará real significado à existência de nossa sociedade japonesa. O “Colégio Japão-Brasil” deverá ser concebido sob este propósito, objetivo e visão.

Tadao Umesao, ex-diretor do Museu Nacional de Etnologia do Japão, na palestra de abertura do Simpósio Comemorativo dos 70 anos da Imigração Japonesa no Brasil, intitulada “Nós Participamos no Novo Mundo”, proferiu:

“Não se entende por integração a perda total de identidade cultural. Em termos de  Brasil, não significa que os nikkeis devam perder completamente elementos essenciais da cultura japonesa, e sejam desvendados e soterrados na cultura básica brasileira. Aproveitar o que existe de relevante na cultura tradicional japonesa para o progresso do Brasil, não seria este o verdadeiro sentido da integração? Integração social e pluralismo cultural sempre coadunam. Mesmo que a miscigenação racial progrida sem retorno no Brasil, não passaria ela pelo caminho de formação de uma nova civilização baseada no pluralismo cultural, onde participam os elementos tradicionais das diversas culturas.”

“Com que bagagem cultural poderá a comunidade nipo-brasileira contribuir nessa oportunidade à sociedade brasileira? A capacidade intelectual, a precisão e o racionalismo científico compõem outros aspectos da nossa cultura. E, também, a grande ênfase dada à educação, para que tudo isso seja transmitido com fidelidade às próximas gerações. São esses os fatores que levantaram a ciência e a tecnologia japonesa aos níveis atuais. Se quisermos destacar mais um aspecto tradicio0nal e cultural do Japão, será sem dúvida a elevada capacidade de organização, que se revela na seriedade com que as relações humanas são tratadas, no alto espírito cooperação e associação. Quero crer que todas estas qualidades presentes na cultura tradicional japonesa sejam extremamente valiosas também à sociedade brasileira. Espero que sejam preservadas em segurança entre nipo-brasileiros, para serem oferecidas como contribuição à sociedade brasileira. Herança cultural não é questão de sangue. Por mais que a miscigenação prossiga, as nobres qualidades culturais podem ser eficientemente transmitidas de geração a geração por empenho das famílias, das escolas e da sociedade. Nem é necessário dizer quanto é privilegiada a posição dos imigrantes japoneses e seus descendentes para a difusão desses excelentes aspectos na sociedade brasileira. A herança cultural se transmite homem a homem.”

 

Que o “Colégio Japão-Brasil” esteja à altura de outros colégios de origem étnica

A “Veja São Paulo” de 3 de outubro de 2001 publicou o resultado da pesquisa realizada por 100 especialistas do setor educacional sobre os 324 colégios particulares do município de São Paulo, na forma de um ranking das “Melhores Escolas da Cidade”. Todos os colégios de origem étnica, sem exceção, conquistaram uma posição entre os 50 melhores.

Ranking         Nome do colégio                                                      Pontuação      Origem

1                   Colégio Visconde de Porto Seguro                                  94,1            Alemã
7                   Colégio Miguel de Cervantes                                           81,1            Espanhola
8                   Colégio Dante Alighieri                                                   79,9            Italiana
10                 Colégio Humboldt                                                           76,9           Alemã
14                 Colégio I.L. Peretz                                                          76,0           Israelita
18                 Colégio Hebraico Brasil Renascença                                73,0            Israelita

Entre os mais bem avaliados, o mais tradicional é o primeiro colocado, Colégio Porto Seguro, com 123 anos de existência. Por outro lado, o mais novo é o Colégio Miguel de Cervantes, com apenas 23 anos, fundado em 1978. Para fundar o Colégio Miguel de Cervantes, a comunidade hispano-brasileira adquiriu um terreno no Morumbi e o governo espanhol ajudou na construção. É importante pensarmos por que este colégio tenha chegado à excelente sétima posição em apenas 23 anos de sua existência.

Existe a opinião de que “a integralização dos descendentes japoneses na sociedade brasileira vem ocorrendo de tal forma que, nesta altura, a fundação do colégio da origem japonesa já perdeu seu momento oportuno”.  Porém, o auge da imigração espanhola se deu na segunda metade do século XIX. Mas, teve quase nenhuma representatividade numérica, a partir do século XX, comparada aos japoneses,  maior imigração deste século. É curioso por que é que agora, depois de mais de 100 anos desde que começou sua imigração, com a comunidade já miscigenada e as gerações avançadas até sexto ou sétimo grau, a comunidade da origem espanhola, em conjunto com o governo espanhol, tenha resolvido fundar um colégio étnico. Qual foi a intenção? Com que finalidade eles envidaram tanto esforço, a ponto de fazer com que o colégio, em tão pouco tempo, estivesse entre os melhores do ranking?

Ao estudar a construção do colégio nipo-brasileiro, precisamos pesquisar, estudar e analisar, com maior objetividade, os colégios de outras etnias.

Podemos, antes de tudo, afirmar que, para introduzir as virtudes do nosso povo e da nossa cultura na sociedade brasileira, as tais virtudes precisam ser consideradas como objetivo de formação dos alunos e fazer parte da missão do colégio. E, para isto, precisamos concentrar nosso trabalho na fase infanto-juvenil, na qual a personalidade se encontra ainda em formação. Neste sentido, o formato ideal do colégio seria de oferecer o ensino integrado desde o fundamental até o médio. O diretor do Colégio Porto Seguro disse: “somos um colégio que prepara por meio de educação as pessoas que contribuirão no futuro à sociedade.”.

Antes tarde que nunca, devemos fundar o Colégio Japão-Brasil, que supere os colégios de outras etnias, com vistas a uma instituição de ensino de excelência.

 

“Colégio Japão-Brasil” como centro de referência de difusão da língua e cultura japonesa

Na Comissão de Estudo do Colégio Japão-Brasil, citada anteriormente neste texto, não foram poucos os que opinaram que o Colégio não deveria concorrer com as tradicionais escolas da língua japonesa. No entanto, se a ideia do colégio a ser concebida for nesta dimensão de eventual possibilidade de competição, não vejo nenhum sentido em fundar tal colégio. O “Colégio Japão-Brasil” deve visar, além de ser um núcleo de difusão da cultura japonesa na sociedade brasileira, ser um centro de referência e modelo para as escolas de ensino do idioma existentes.

Para mencionar como referência, na comunidade teuto-brasileira, conforme já citado neste texto, os colégios Porto Seguro e Humboldt, Goethe Institut, Consulado Geral da Alemanha e Câmara de Indústria e Comércio Alemã se reuniram, há 20 anos, para formar um conselho consultivo com o intuito de discutir como difundir de forma eficiente sua língua e cultura,  bem como colocar as deliberações em prática de maneira mais funcional. Tem-se, como um exemplo da iniciativa desse conselho, a formação do corpo docente com amplos conhecimentos da língua e cultura alemã. As empresas alemãs forneceram uma grande quantia financeira para capacitação de professores (a pesquisa realizada em 1982 pelo Centro de Estudos Nipo-Brasileiro revelou que a Câmara de Indústria e Comércio Alemão no Brasil desembolsou US$ 2 milhões em cinco anos para criar e colocar em funcionamento o curso de formação de professores). E, hoje, existem cursos mais avançados dentro do Goethe Institut para formar professores da língua e cultura alemã no nível superior. Também foi instituído um curso de formação de professores especializado em ensino de língua alemã na Universidade de Vale do Rio dos Sinos, do estado do Rio Grande do Sul. As decisões tomadas no conselho consultivo são comunicadas aos representantes regionais para que sejam postas em prática junto às escolas onde são mantidos cursos de língua alemã.

O Centro de Estudo Nipo-Brasileiro, com base no resultado da pesquisa realizada em 2001, a pedido do Centro de Língua Japonesa da Fundação Japão, propôs a esta autarquia japonesa a necessidade de a comunidade nipo-brasileira criar um conselho consultivo, seguindo o exemplo da comunidade teuto-brasileira, com intuito de disseminar, de forma mais abrangente e orgânica, a língua japonesa. Baseado nesta proposta, reuniram-se em 2002, os representantes do Centro Brasileiro de Difusão da Língua Japonesa, Aliança Cultural Brasil-Japão, Centro de Estudos Japoneses da USP, Centro de Línguas das Escolas Estaduais de São Paulo (CEL) e do Paraná (CELEN), colégios particulares e universidades que mantêm curso da língua japonesa, Fundação Japão, JICA e Câmara de Indústria e Comércio Japonesa do Brasil, formando, dentro do Centro da Língua Japonesa da Fundação Japão, o conselho consultivo e integrando as entidades que até então trabalhavam com o ensino do idioma de forma isolada, para então promover a difusão da língua japonesa de forma mais orgânica e funcional através de uma maior interação entre as partes integrantes do conselho.

Quando, no futuro, o projeto do Colégio Japão-Brasil se materializar, as opiniões geradas nesse conselho darão grandes contribuições. As escolas de língua japonesa existentes também integravam o conselho, portanto, o futuro Colégio Japão-Brasil poderá incorporar o conselho dentro da sua estrutura e dessa forma poderá estender para estas escolas as atividades de difusão da língua e cultura japonesa definidas no conselho. Dessa forma, as escolas de língua japonesa também poderão se beneficiar do trabalho do conselho consultivo. Hoje, tendo em vista o centenário da imigração japonesa, os projetos de fundação de Colégio Japão-Brasil, como projetos comemorativos, vêm sendo apresentados às comunidades nipo-brasileiras de várias regiões. Seria realmente ideal, se cada região pudesse fundar seu colégio étnico. Assim, representantes desses colégios também poderiam integrar o conselho consultivo tomando parte nas discussões, e o Colégio Japão-Brasil de São Paulo, por sua vez, assumiria o papel de escola-modelo, pondo em prática essas decisões, e posteriormente estendendo o novo know-how adquirido aos colégios associados. Assim, o novo Colégio Japão-Brasil não se tornaria alvo de críticas por conta da concorrência com outros colégios ou por ser uma instituição que privilegia apenas uma parcela de estudantes residentes na capital paulista. Se não for colégio assim, não há motivo para sua constituição.

Conforme citado anteriormente, Tadao Umesao, ex-diretor do Museu Nacional de Etnologia do Japão, naquela palestra de abertura do Simpósio Comemorativo dos 70 Anos da Imigração Japonesa no Brasil, proferiu: “a transmissão da tradição cultural é viabilizada por meio da transmissão entre as pessoas. No entanto, a ruptura de comunicação rompe a transmissão de cultura. Se é que a cultura japonesa tem algo a oferecer ao mundo, nós, que somos da linhagem cultural do Japão, precisamos constantemente manter a solidariedade cultural”. Em outras palavras, para que possamos contribuir à sociedade brasileira com as virtudes da cultura japonesa, precisamos preservar amplo canal com o Japão, de onde provém a nossa cultura, e manter vivos os laços de solidariedade para que não ocorra a ruptura. Neste sentido, é imprescindível a participação do Japão neste projeto bem como sua colaboração para construir e manter um canal de solidariedade. Será fundamental contar com a cooperação do Japão.

Epílogo

Apresentei repetidas vezes os motivos pelos quais a comunidade nipo-brasileira, agora mais do que nunca, precisa abraçar o projeto do Colégio Japão-Brasil como principal projeto comemorativo do centenário da imigração japonesa. Porém, tenho minhas reservas quanto ao grau de entendimento que as pessoas envolvidas irão demonstrar em relação a esta proposta. Isto é, numa sociedade de gerações onde o senso de etnicidade (ethnicity, caráter ou qualidade de um grupo étnico no que se refere a sua distintividade  e sua identidade sociocultural) vem ficando cada vez mais tênue, a ideia terá sua repercussão, compreensão e concordância até levar a sua construção. E, o que mais receio é, mesmo tendo grupo de pessoas que concorde e compreenda este intuito, sua inexequibilidade, quando chegar à fase de estruturação  e realização, através de atual Bunkyo com seus representantes compostos principalmente pelos nisseis.

Felizmente, dentre as virtudes culturais trazidas pelos imigrantes, que até hoje persistem, conforme citadas na palestra de Tadao Umesao, encontram-se alta capacidade de organização, forte espírito de colaboração e união.

Citando como exemplo, o fato acima pode ser comprovado pelo Festival do Japão promovida pela Federação das Associações de Províncias do Japão no Brasil –  Kenren, formada, sobretudo pela geração dos imigrantes. Embora este evento tenha recebido várias críticas de terceiros, o fato de a Kenren ter planejado, realizado e alcançado sucesso cada vez maior a cada ano, se deve às virtudes que os integrantes desta entidade possuem, ou seja, alta capacidade de planejamento, sólida organização baseada num forte espírito de colaboração, capacidade de execução e solidariedade.

Tais virtudes tradicionais da cultura japonesa, pode se dizer que, são difíceis de encontrar no povo brasileiro, mas, da mesma maneira, não se encontrará nas novas gerações nikkeis, se não houver  sua transmissão.

Se a situação não mudar, receio que o centenário, da mesma forma que os 90 anos da imigração, acabará se reduzindo a apenas algumas solenidades momentâneas e modestas, sem deixar nenhum projeto que este marco histórico merece.

A constituição do “Colégio Japão-Brasil”, baseada nos princípios básicos citados até aqui, é o projeto mais significativo, se considerarmos a nossa atual situação, em que os tradicionais valores da cultura japonesa não vêm sendo transmitidos a novas gerações. Mas, para concretizá-la será indispensável a participação da geração dos imigrantes, que preservam ainda fortemente essas virtudes.

Uma vez fundado, é óbvio que a responsabilidade de tocar esta obra será das gerações posteriores. Independentemente de quem sair como vencedor desta eleição, as novas gerações  devem se engajar para realização do Colégio Japão-Brasil, contando com a colaboração da geração dos imigrantes, que muito têm a oferecer neste processo, e através desta realização, receber as virtudes da cultura japonesa que as novas gerações vêm esquecendo gradativamente. E, difundir essas virtudes na sociedade brasileira para a formação de uma nova cultura e civilização, mesmo que um dia a denominação “nikkei” venha a desaparecer. Mas, deixará a marca de existência de imigrantes japoneses e seus descendentes,  e sua contribuição a este país nunca será apagada da história.

Provavelmente, o centenário será, além de um importante marco, a última oportunidade de realizar um projeto comemorativo. Portanto, a geração dos imigrantes e as novas gerações devem se unir, se complementar e cooperar mutuamente para concretizar e deixar para as futuras gerações o projeto comemorativo do centenário, a fim de não se arrependerem mais tarde.

Sentirei muita felicidade se esta proposta servir como catalizador para a fundação do Colégio Japão-Brasil.

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