reservas internacionais do Brasil

 

O tema das reservas internacionais do País ganhou destaque na imprensa recentemente, por causa da intensificação das compras de dólares pelo Banco Central (BC) e do aumento da alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para aplicações de não residentes em renda fixa e nos depósitos de margem nas transações em derivativos nas bolsas. Tudo isso visa a combater a tendência à valorização do real ante o dólar norte-americano. As últimas cifras do BC indicam um saldo de reservas igual a US$ 282 bilhões em 18/10/2010, nível jamais alcançado por esse indicador de liquidez internacional na história da economia brasileira.

 

 

Vários analistas têm chamado a atenção para os custos associados à manutenção de nível de reservas tão elevado. A simples comparação entre a taxa básica de juros da economia brasileira – taxa Selic de 10,75% ao ano – e a taxa de remuneração das reservas internacionais, algo entre zero e 2,48% ao ano (considerando um intervalo entre a taxa dos Fed funds e a da remuneração nos títulos do Tesouro americano de dez anos de prazo), pode dar uma ideia do provável custo financeiro desse nível de reservas cambiais.

Na verdade, aquela conta representa uma simplificação grosseira dos custos do estoque de reservas. Os encargos relevantes seriam aqueles que resultariam da manutenção de um nível de reservas excedentes, medido como o saldo além e acima do estoque considerado ótimo, para as condições atuais do setor externo brasileiro e da economia global. A questão, portanto, resume-se de fato a estabelecer qual seria esse nível ótimo de reservas para o Brasil. Vários estudos acadêmicos já discutiram modelos teóricos para a fixação desse nível. As variáveis consideradas relevantes têm que ver com o crescimento das importações de bens e serviços, os fluxos de investimentos externos diretos e os encargos decorrentes dos serviços da dívida externa. Nos anos da crise da dívida externa brasileira, havia uma regra de bolso simples, que indicava um estoque mínimo necessário para cobrir as importações de bens por três meses. Por tal critério, o saldo atual de reservas seria mais do que suficiente para enfrentar as turbulências externas, pois os últimos dados do Banco Central mostram um montante de divisas capaz de garantir um período de 20 meses de importações de bens.

Saliente-se, no entanto, que mesmo essa conta singela provavelmente ainda subestima o verdadeiro custo de oportunidade social dos recursos econômicos aplicados na acumulação de reservas internacionais.

Pode-se pensar que a decisão de manter um saldo de reservas internacionais de um país se assemelha à de adquirir um plano de seguro contra imprevistos futuros, pois aquele estoque se destina à proteção contra eventos desfavoráveis que, por meio da restrição às importações, podem comprometer o funcionamento da economia interna. A decisão de comprar um programa de seguros pode ser resumida na seleção de duas variáveis críticas passíveis de ser estimadas: a probabilidade da ocorrência de um sinistro, representado por um choque externo negativo, e o grau de exposição da economia nacional ao choque.

No caso das reservas, essa analogia simples com a compra de um plano de seguros é mais complicada, pois a decisão de adquirir a cobertura do plano afeta, ela própria, o tamanho da exposição ao risco experimentado pela economia. Isso pode ser visto analisando-se o efeito monetário da compra de dólares pelo Banco Central para evitar a apreciação da taxa de câmbio. O aumento das reservas internacionais seria, em princípio, financiado por uma expansão monetária em reais, o que tenderia a reduzir a taxa básica de juros. Para evitar tal efeito, o Banco Central vende títulos públicos no mercado para manter a taxa Selic no nível anterior. Isso, por sua vez, estimula a entrada de novos fluxos de capitais e provoca outra rodada de valorização da taxa nominal de câmbio. Assim, de maneira perversa, a atuação do Banco Central acaba contribuindo para aumentar o nível de reservas externas excedentes e a valorização cambial, o que amplia o risco de déficits crescentes nas contas correntes e a vulnerabilidade externa a choques.

Tudo indica, portanto, existir um grau de redundância no atual nível de reservas internacionais, implicando custos econômicos significativos. Como já sugerido por vários analistas, a maneira mais apropriada para lidar com isso seria uma mudança na combinação de políticas fiscais e monetárias, com um aperto na política fiscal e maior flexibilidade na política monetária. Isso resultaria na queda na taxa nominal de juros em reais e na menor atratividade para as entradas de capital externo. Lamentavelmente, essa mudança talvez tenha de esperar o novo governo.

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